quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Para quem é real e é de mim


Fazia tempo que eu não escrevia. Me dizia ocupada. Na verdade, eu acho que não escrevia porque andava muito feliz ultimamente... e felicidade não é lá muito inspiradora. Não falo da felicidade de amar, mas sim da felicidade de viver simples e moderadamente. Aquela felicidade que a gente encontra no cotidiano... a das "horinhas de descuido" do Guimarães Rosa. Enfim, eu estava feliz e não tinha vontade de escrever. É possível medir minha felicidade pela quantidade de posts que escrevi aqui: fui do inferno de vomitar palavras para aliviar o peso de mim... ao paraíso do não ter/querer nada a dizer. Acho que a escrita era terapia e eu me dei alta.

Não consigo entender por que este tipo de felicidade que eu vivo agora não me é inspiradora. Esse é um mistério que acho que jamais entenderemos... e ao pensar nisso ouço Bethânia cantarolar: "Pra fazer um samba com beleza é preciso um bocado de tristeza..." Diante disso não preciso dizer que estou aqui porque fui tocada por ela: a danada da tristeza.

A tristeza e o sofrimento que me inspiram neste momento não são extamente meus. Mas, ao mesmo tempo, são mais meus do que se tivessem nascido em mim. Contraditória verdade. Sofro a dor do outro, como fazemos nas artes. Só que o mocinho que chora e me comove não é personagem de nenhum dramaturgo. Ele é real e é de mim. Eu não vou ver as letrinhas passarem na minha frente quando o "filme" acabar. Não vai ter aplauso no final do "espetáculo". Eu não vou esquecer as lágrimas que o vi derramar e que também provocaram as minhas. Porque ele é real e é de mim.

Ao saber da dor do amigo automaticamente me lembrei de "Pálpebras de neblina" do Caio F. Sempre o Caio. Neste texto ele relata um dia ruim, em que pensava: "Ah! como eu precisava tanto de alguém que me salvasse do pecado de querer abrir o gás." No auge da sua dor ele testemunha a dor de uma desconhecida. No auge da sua dor do "não-ter" ele é requisitado por alguém que é dele: "Depois, um amigo me chamou para ajudá-lo a cuidar da dor dele. Guardei a minha no bolso. E fui. Não por nobreza: cuidar dele faria com que eu me esquecesse de mim. E fez. Quando gemeu "dói tanto", contei da moça vadia chorando, bebendo e fumando (como num bolero). E quando ele perguntou "porquê?", compreendi ainda mais. Falei: "Porque é daí que nascem as canções". E senti um amor imenso. Por tudo, sem pedir nada de volta. Não-ter pode ser bonito, descobri. Mas pergunto inseguro, assustado: a que será que se destina?"

Felizmente não era este o meu caso. Eu continuava na minha onda de "horinhas de descuido"... felicidade cotidiana. Enquanto o Caio colocou sua dor no bolso e foi ao encontro do amigo, eu enchi minha mala com o máximo de feliciade que podia carregar e parti. Um bocadinho longe, um bocadinho caro (rsrs), mas foi uma experiência impagável. Daquelas que merecem e precisam ser compartilhadas. Precisam ir além da memória de quem as vivenciou. Foram seis dias inesquecíveis.

Em resumo, o que eu posso dizer é que foi só AMOR. De todo jeito. De todo o lugar. Em suas várias faces e facetas. De onde eu já tinha certeza, veio. De onde eu não esperava, veio. De onde eu sequer imaginava que podia despontar, veio. Forte, intenso, embriagante, acolhedor. Maremoto. Vendaval. Entre risos e lágrimas fui feliz e o fiz feliz. Sei que a dor dele continua lá... porque ela ainda lateja em mim. Mas sei também que ela já não é a mesma: dor míngua, assim como o amor quando não é alimentado.

Hoje as palavras voltaram aos meus papéis em branco. A tristeza me tomou pela mão e fez como aquelas professoras de antigamente, que desenhavam as letras juntos com seus aprendizes. Hoje eu estou triste, mas como sempre, também estou feliz. Feliz pelo que tenho, aliás... pelos que tenho. É para eles que vivo. É por eles que sou.

Lembrei agora da capa do CD do Marcelo Camelo, que para olhos desatentos não tem significado algum. Um jogo em que a palavra sou, também pode ser lida nós. Depende de como você olha. Depois que descobri isso eu nunca mais consegui ler o sou. Essa será minha próxima tatuagem. Diz muito de mim. Diz muito dos meus.


3 comentários:

  1. Que ideia boa essa da tatuagem, Créa! Tu és um gênio! :D Hauauhauahuahaahauha Saudades muitas, neguinha!!

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  2. Eu sou realmente um gênio Branca!!! Sinta-se lisonjeada por fazer parte do que ela significará para este gênio aqui!!! hahahahaha... Herodes!!!

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  3. É NóS!!!!!! Simples assim e grandioso!

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