Amar torto não significava, na sua cabeça também torta, que aquele amor não fosse também bonito. Era apenas a sua maneira de amar, que, assim como ela, era pouco convencional. Difícil de entender. Mais ainda de explicar. Tentou traduzir:
É intenso. Se expressa em pequenos gestos. Quase nunca em palavras. Ele é péssimo com as palavras. Aliás, não é. Ele é bom com as palavras, desde que elas não saiam da sua cabeça. Na sua cabeça ele é delicadamente decifrado em vocábulos doces, sutis, delicados e intensos. Mas só são assim lá. Fora dela quase sempre são uma verdadeira catástrofe.
Mas ele também sabe ser bonito. Daquela "boniteza" das coisas pequeninas e singelas como sorriso de criança. Como a primeira palavra dita, que quase nunca é a esperada. Como olhar pela janela e ver o céu alaranjado. Como tomar chuva na primavera voltando pra casa, que primeiro aborrece... mas quando você se entrega, é como se o peso das coisas se esvaisse com a água impura e a gente voltasse a ser aquela criança desprovida de angústias. Como tomar sorvete de tapioca olhando o mar sujo da Ribeira. Como molhar os pés na água fria do mar, que primeiro assusta, congela... mas depois lhe refresca a alma.
É como ser assaltado. É como ser assaltado. Repetia involuntariamente. Depois de ter passado horas tentando traduzir sua forma de amar, ela finalmente conseguiu traduzí-la em poucas palavras. É como ser assaltado. Em sua lógica, também torta, teorizou: primeiro o susto, depois o medo, a tentativa de reagir, em seguida a entrega de tudo que tens de mais precioso, o êxtase por sair ileso quando o outro tem compaixão ( e não é sempre), e por fim... a sensação de que está faltando alguma coisa. Concluída sua teoria, se perguntou: quem em sã consciência iria andar pela vida querendo ser assaltado? Não ousou responder. Apenas sorriu.
Achei ótimo!
ResponderExcluirSaudades!
Que lindo você por aqui amordavida!
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