Quando cheguei em Angola, uma coisa me chamou a atenção: os cabelos das mulheres. Baseada no termo que usamos no Brasil, "cabelo afro", imaginei que aqui fosse encontrar as mulheres com suas belas cabeleiras eriçadas, seus penteados de tranças e coisas assim. Ledo engano!
Fiquei supresa quando vi que a maioria esmagadora delas usa cabelos lisos. Pior, usam perucas!!!E quando não estão com os cabelos "arrumados" colocam turbantes ou lenços na cabeça, com exceção das mais velhas, que ainda preservam algumas tradições. É verdade que algumas optam pelos apliques, em alguns casos até cacheados. Mas nunca não seus cabelos de verdade. Somente nas crianças, ainda que a contragosto delas, é possível ver os cabelos naturais. Isso é muito assustador, até porque aqui não existem muitas brancas com suas cabeleiras lisas para elas se espelharem. Mas existem as benditas novelas... a bendita tv, que dita o que é bonito ou feio.
Outro dia eu estava na porta de um hotel e a camareira veio falar comigo. Ela me disse:
- Que bonito seu cabelo. É seu mesmo? Perguntou, tocando-o incrédula.
- Sim, é meu sim. Por quê?
- Porque parece "cabelo brasileiro".
- Mas é cabelo brasileiro, disse rindo. Eu sou brasileira. Lá a gente chama cabelos como meus de afro. Engraçado que aqui vocês preferem os cabelos lisos e dificilmente usam os seus próprios cabelos. Por quê?
- Porque é bonito e tá na moda.
A resposta dela foi ligeira e simples. Pode até ser verdade, mas eu acho que o buraco é mais embaixo. A análise desse buraco eu deixo para os antropólogos, que o fazem muito bem.
Lembrei de quando eu tinha meus cabelos "lisos" e da mudança que se processou em minha vida quando resolvi assumí-los crespos. Tive vontade de fazer um discurso, mas me contive.
Fiquei sabendo que no Brasil a moda agora são os cabelos crespos, fenômeno impulsionado pela personagem de Taís Araújo na novela das oito. Mais uma vez a novela dita a moda e esta, por sua vez, dita o comportamento das pessoas. Certamente enquanto a novela estiver no ar todos acharão os crespos bonitos. Quando a novela acabar, Deus é quem sabe o que acontecerá com eles. Eu aposto numa corrida aos salões para tentar voltar "ao estado natural". Gostaria de ser otimista e acreditar que os cabelos crespos passarão a ser um marcador identitário importante para as mulhes negras. Mas acho difícil. Somos escravos da moda e é difícil remar contra a maré.
Voltando ao choque de realidade... desfiz um monte de ilusões sobre a África desde que cheguei aqui. Essa era uma delas. Achei que ia vivenciar a negritude em seu "estado puro", mesmo sem saber direito o que isso queria dizer. Talvez eu ainda descubra... talvez nunca venha a saber.
Minha preta, vc está arrasando nos textos!!! Que bom ser de você!!!
ResponderExcluir